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Hoje viajamos para...

 

Demonization

 

 
Sumário
  • Escolhe um coletivo de pessoas que estão a ser demonizadas à tua volta.
  • Procura nesse coletivo um elemento que genuinamente aprecies - cultura, música, folclore, dança, cozinha, tradição, trajes típicos, hábitos, etc...
  • Faz um discurso informativo sobre esse elemento que aprecias sem defender ativamente o coletivo e sem pedir às pessoas para se solidarizarem ou sentirem pena por eles.
  • Não expliques o propósito desta secção.
 

A nossa identidade de grupo

Os humanos são criaturas tribais. De um ponto de vista evolucionista, as criaturas humanas necessitam do suporte de uma estrutura social para sobreviver. Os bebés humanos registam a maior dependência face aos progenitores de todas as espécies e, mesmo depois disso, o Homo Sapiens Sapiens não é particularmente dotado para a corrida, a escalada ou a natação. Nenhum dos seus sentidos é particularmente desenvolvido. Fomos concebidos para procurar e formar as estruturas coletivas que nos garantem maiores hipóteses de sobrevivência - desde caçar presas maiores em conjunto a dividir mais eficientemente o trabalho para encontrar potenciais parceiros.

 


Quando cais na armadilha da demonização, podes ser facilmente manipulado como um touro nas touradas espanholas. (Foto: Francis Heylighen )
Quando cais na armadilha da demonização, podes ser facilmente manipulado como um touro nas touradas espanholas. (Foto: Francis Heylighen )

Nos dias de hoje, nada mudou, no fundo. Ainda sentimos um forte desejo de "pertencer" a um grupo. No entanto, quando levada ao extremo, esta necessidade de pertença transforma-se naquilo a que os antropologistas chamam de "tribalismo tóxico" - uma adesão tão extremada ao próprio grupo que se torna inconsciente, dogmática e hostil perante outros grupos.

Quando algo se torna inconsciente e automático, já não estás em pleno controlo. Não estás a analisar criticamente se o que lês ou te dizem faz algum sentido, desde que corresponda à identidade do grupo. E pior - as tuas reações tornam-se previsíveis. Deste modo, tornas-te um alvo fácil de manipulação - muito da mesma maneira que o touro é posto a fugir em qualquer direção se acenarem à sua frente com algo que ele entende como perigoso.

Demonização (Desumanização)

Demonização é uma técnica bastante comum, usada para incendiar o tribalismo tóxico e levar coletivos a comportar-se de uma determinada maneira. Consiste em atribuir e generalizar atributos bastante negativos a membros de um grupo diferente. Estes diferentes grupos podem ser geográficos (demonizar pessoas de outros países ou regiões), étnicos (demonizar raças específicas), religiosos (demonizar os membros de uma determinada religião), etc. Podes ver alguns exemplos de desumanização na imagem de abertura desta atividade.

Por vezes, a demonização começa com um simples alvo - como o líder ou o representante mais conhecido de um grupo escolhido como alvo. Nas palavras do Instituto Cato:

Assim que começas a demonizar o presidente ou o líder de um país, estás a incutir uma permanente desumanização de cariz ideológico no coração e nas mentes dos americanos e a justificar futuros atos de violência contra esse país e o seu povo."

Apesar da sua frontalidade, é um método bastante eficaz devido às imagens fortes que cria no público e porque cria um sentido de ameaça advinda de outros grupos. Quando medo e ódio suficientes são incutidos num indivíduo, este pode ver-se obrigado a fazer coisas que nunca faria nem estaria disposto a fazer em circunstâncias normais, ao ponto de poder matar e de sacrificar a sua própria vida.

Hermann Göring, um dos mais proeminentes líderes do partido Nazi, fundador da Gestapo e comandante da Força Aérea Alemã (a Luftwaffe), ilustrou isto perfeitamente no seu depoimento perante o Tribunal de Crimes de Guerra de Nuremberga:

Porque é que, claro, as pessoas não querem a guerra. Por que haveria um pobre coitado de uma quinta querer arriscar a sua vida na guerra quando o máximo que pode tirar dela é voltar inteiro para a sua quinta? Naturalmente, o cidadão comum não quer a guerra; nem na Rússia, nem em Inglaterra, nem na América, nem, para o caso, na Alemanha. Parece-me óbvio. 
No fim de contas, são os líderes do país que definem as suas políticas e é sempre uma simples questão de arrastar as pessoas, seja numa democracia, numa ditadura fascista, no Parlamento ou numa ditadura comunista.
As pessoas podem sempre ser trazidas para a causa dos líderes. Até é fácil. Tudo o que tens de fazer é dizer-lhes que estão a ser atacados e denunciar os pacifistas pela sua falta de patriotismo e por exporem o país ao perigo. Funciona da mesma maneira em qualquer país.

Apesar de a demonização de outros grupos e dos seus líderes existir desde sempre, tem-se tornado prática corrente nos últimos tempos, apoiada na viralidade das redes sociais. Em 2016-2017, a Amnistia Internacional emitiu um relatório a alertar contra os perigos destas táticas.

Porquê demonizar?

As pessoas que utilizam a demonização de grupos fazem-no, basicamente, por duas razões:

  • Para fazer avançar a sua própria agenda política. Por exemplo, é muito mais fácil aumentar custos militares se existir, entre as pessoas, a noção de que o seu estilo de vida está sob ameaça. É muito mais fácil aumentar o orçamento das polícias se existir a perceção um aumento da criminalidade na comunidade. Na verdade, a demonização é uma forma assustadoramente barata de fazer avançar legislação e agendas políticas.
  • Para mudar as atenções para assuntos diferentes ou para distrair a opinião pública. Por exemplo, se o teu partido tiver sido apanhado a desviar dinheiro, é muito mais fácil passar por entre os pingos da chuva se todo o partido começar a falar sobre outros assuntos.

Lutar contra o tribalismo tóxico e a desumanização

Lutar contra o tribalismo tóxico, a desumanização e os estereótipos negativos, no geral, não é tarefa fácil, sobretudo, se for feito de maneira subtil e discreta.

Este pequeno vídeo satírico demonstra como os chamados estereótipos implícitos podem ter origem como reação a uma realidade social, mesmo apesar de as pessoas envolvidas estarem a par da sua existência e de não a desejarem.

Uma pessoa pode pensar que o tribalismo deve ser combatido através da demonstração da irracionalidade da demonização ou dos estereótipos e através do apelo ativo para que as pessoas não se deixem levar por isso. Apesar de produzir alguns efeitos, estudos demonstram que esta estratégia funciona apenas a curto prazo. Por esta razão, neste projeto, o teu discurso não deve ser sobre pedir às pessoas para pararem de fazer isto ou aquilo, nem tentar apresentar argumentos racionais para tal.

Existem vários métodos comprovados que resultam contra a demonização e a generalização.

Sugerir contraexemplos positivos

A primeira medida é expor os acusadores a membros do coletivo discriminado cujas qualidades são contrárias aos estereótipos de que os acusam ("contraestereótipo"). A dose certa de exposição faz diminuir bastante os estereótipos. Por exemplo, se o estereótipo for de que "os ciganos são ladrões", um contraestereótipo seria falar com um respeitável cigano, com sucesso na vida e de comportamento exemplar.

A boa notícia aqui é a de que os contraestereótipos são eficazes até quando são apenas imaginados. Isto é apenas uma aplicação prática de uma técnica de imaginação amplamente conhecida - na qual basta imaginar ou pensar de forma estruturada uma situação para estares melhor preparado para ela. Da mesma maneira, basta imaginares um cigano respeitável para sentir o estereótipo perder força.

Aviso - estudos também sugerem que contraexemplos extremos podem ter um efeito boomerang, reforçando o estereótipo. Um mecanismo semelhante a "ah, mas isso deve ser a exceção que confirma a regra", aparece no nosso cérebro. Por isso, se o estereótipo for o de que "as mulheres são fracas", por exemplo, o contraexemplo deve referir mulheres fortes normais e comuns e não exemplos extremos como a Rainha Elizabeth II ou a Joana d'Arc.
Existe mais um efeito positivo de apresentar contraexemplos aos estereótipos. Estudos demonstram que quando pessoas estão perante contraexemplos das suas convicções, elas tornam-se mais flexíveis e têm um pensamento mais aberto.

Quebrar o ciclo vicioso de reforço

A pressão e as regras sociais (reais ou percecionadas) podem desempenhar um papel importante na formação e perpetuação destes estereótipos. As nossas crenças são reforçadas se pensarmos que a maioria da população pensa da mesma forma. Na verdade, as experiências de conformidade de Asch demonstram que a pressão social pode fazer-nos abdicar do senso comum e adotar ideias que são clara e visivelmente erradas.

Estudos demonstram que quando as pessoas se tornam conscientes de que os outros não partilham das suas visões, os estereótipos diminuem. Na realidade, um dos objetivos deste projeto é precisamente fornecer testemunhos que expressem, "Ei, estou aqui, e penso de maneira diferente sobre estas pessoas. Se acreditares na demonização que te estão a transmitir, estou aqui para afirmar claramente que não partilho da tua opinião".

Examinar criticamente mensagens vindas do exterior e as nossas próprias crenças

Podemos dar um passo fundamental na luta contra o tribalismo tóxico ao escrutinar, verificar os factos e nunca tomar por verdade qualquer afirmação que ouvimos, sobretudo se contiver elementos imparciais ou generalizações. Esta é uma área sobre a qual vamos trabalhar em detalhe no Percurso de Pensamento Crítico.

Aqui fica um pequeno exemplo de como a demonização se pode instalar de forma subtil e impercetível. Como resultado da pandemia de COVID, muitos países decretaram o confinamento total para impedir a propagação exponencial do vírus. Consegues perceber as diferenças subtis entre as narrativas e entre o modo como as medidas são retratadas nas duas notícias do NY Times?

Double Standards

 

Participar em atividades de cooperação com representantes de grupos demonizados.

É claro que trabalhar em conjunto ou, simplesmente, despender tempo, de modo não-confrontacional, com representantes dos grupos demonizados diminui bastante os estereótipos com o passar do tempo. A capacidade de não julgar, de trabalhar com diferentes tipos de pessoas, de ser flexível, criativo e de ter uma mente aberta são características cruciais para os líderes dos nossos dias e no programa de Liderança Agora trabalhamos para as desenvolver.

A atividade

Na secção da reunião "Hoje Viajamos Para..." necessitarás de duas coisas:

Investigação

Estar atento e observar, para poder detetar sinais de demonização à tua volta - seja nas redes sociais, em comentários de amigos, na TV, nos jornais, etc., e determinar qual o coletivo alvo de demonização. Talvez até tu próprio tenhas esse tipo de comportamento?. É importante para esta atividade que a demonização aconteça no teu contexto e não noutro lado ou em teoria. Se viveres na Suécia, não escolhas os Africanos demonizados em Espanha. Terás, decerto, outros coletivos mais próximos para escolher.

Em muitos países, não necessitarás de muito esforço para os encontrar. A Rússia e os EUA demonizam-se um ao outro, tradicionalmente, nas suas respetivas esferas de influência. O mesmo pode ser dito sobre os atores políticos do Médio Oriente. A China e o Japão são outro clássico. Na verdade, é fácil encontrar na Internet mapas irónicos (mas que refletem a realidade) de quem odeia quem, como este mapa do "ódio na Europa".

Hatemap Europe

A maior parte da demonização não é explícita mas sim subtil. Uma boa prática para detetar esta realidade é ler/ver opinion-makers populares (nos media tradicionais, blogs de referência, influenciadores, etc.) e estar atento às notícias que te fazem não gostar, julgar ou condenar alguém. Tudo o que te suscite uma reação emocional negativa a um grupo de pessoas.

Discurso do Clube

2 Assim que tiveres identificado o coletivo demonizado, o teu objetivo é o de pesquisar sobre esse coletivo e apresentar um discurso de 3-5 minutos em que demonstres algo positivo sobre eles que te tenha chamado a atenção.

Usarás duas técnicas neste discurso:

  • Apresentar um ou dois contraexemplos positivos.
  • Enviar um sinal implícito de que as crenças de demonização não são partilhadas. No final de contas, ao falares de forma positiva sobre um coletivo discriminado, estarás a atuar como prova viva de que existem pessoas com outras crenças.

O discurso deve estar totalmente focado nos aspetos positivos que descobriste. Estes podem qualquer coisa que tenhas descoberto: do folclore à cozinha, dos trajes típicos à arquitetura, das tradições à arte, de um evento histórico aos avanços na ciência produzidos por membros desse coletivo. O discurso deve ser informativo e factual, não persuasivo. Não estás a tentar convencer ninguém de nada - apenas a apresentar uma perspetiva positiva sobre os membros de um coletivo de outra forma ostracizado.

Também é extremamente importante que gostes realmente daquilo de que escolhes falar. Não fales sobre coisas que são "boas em teoria" ou que "toda a gente deve gostar" - fala de coisas de que tu gostes mesmo.

É também muito importante fazer o discurso sobre algo intrínseco ao coletivo (por outras palavras, sobre coisas que são o que são graças a escolhas ou ações diretas desse coletivo em concreto).
Por exemplo, imagina que queres falar sobre os búlgaros. Não vale a pena proferir um discurso sobre o quão bonitos são as montanhas e os lagos da Bulgária porque - como em todas as nações do mundo - é apenas uma coincidência histórica os búlgaros viverem onde vivem e essas montanhas e lagos seriam igualmente bonitos se lá vivessem chineses, japoneses, ciganos ou outros coletivos que ocupassem esse lugar (É claro que a realidade é um pouco mais complexa - os atributos geográficos moldam decisivamente, e ao longo do tempo, a cultura, as tradições e mesmo a forma como um coletivo encara o mundo. No entanto, para o propósito deste projeto, e uma vez que esta transformação toma longos períodos de tempo, vamos assumir que não é relevante).
O que podes fazer, porém, é falar sobre a relação entre o coletivo e o ambiente pois isso depende apenas da sua escolha. Se um coletivo em particular mantém o ambiente limpo, se valoriza os recursos naturais, se promove políticas de desenvolvimento sustentável, etc. Tudo isso preserva a beleza das montanhas e lagos pré-existentes - aí está um tópico ótimo para um discurso.

Como em todos os discursos, tenta manter o foco no tema. Não tens uma hora inteira para falar, por isso tenta transmitir um ou dois pontos-chave e disserta sobre eles. Por exemplo, em vez de apresentares a toda a história e folclore dos ciganos em 5 minutos, foca-te ou numa festa específica ou numa tradição e explica-a em detalhe.

O discurso não deve:

  • Mencionar que o coletivo é alvo de demonização.
  • Questionar o porquê de teres escolhido este coletivo e não outro.
  • Ter pena ou simpatia pelo coletivo, ou alongar-se sobre a sua condição e sobre as suas dificuldades. Por exemplo, se escolheres como coletivo os imigrantes ou refugiados, o tema do teu discurso não deve ser sobre o quão difícil foi para eles chegar ao teu país ou sobre o quão terrível é a guerra no deles.
  • Exortar a plateia a gostar deles ou a agir de uma determinada maneira. Lembra-te - isto não é um discurso persuasivo que acaba com um apelo à ação (Não te esqueças do que os estudos mostram - só conseguirás apenas a ilusão de que mudaste as mentes porque, na realidade, os velhos estereótipos voltarão assim que eles deixarem a sala).

Se fizeres algum dos anteriores, só irás criar resistência que deita por terra o objetivo da atividade.

Não exageres. Lembra-te dos contraexemplos extremos da investigação acima. Se tentares ir para o extremo da positividade, retratar o coletivo que escolheste como o melhor do mundo, ou a sua música/cozinha/etc. como sendo excecionais e encher o teu discurso de adjetivos superlativos, arriscas provocar um efeito boomerang.

O título do discurso deve ter como base "Hoje viajamos para...". Por exemplo:

  • Hoje viajamos para a Rússia.
  • Hoje viajamos para a Califórnia.
  • Hoje viajamos para o mundo dos ciganos.
  • Etc.

Avaliação

O projeto é avaliado de acordo com o cartão de avaliação em anexo.

Nota para o avaliador: Existe uma linha ténue que separa um discurso sobre um coletivo e onde e como vive e um mero discurso em jeito de roteiro de viagem onde o orador narra apenas um sítio agradável onde já esteve. Uma confusão comum neste projeto - da parte dos oradores que não leem toda a descrição - é pensar que o "Hoje viajamos para..." é o que o título realmente sugere - ir a algum sítio agradável e contar uma história sobre isso. Claramente, este não é o caso, e se verificares que o discurso seguiu esta linha, deves indicar claramente que não cumpriu os objetivos, explicar porquê e sugerir que o orador repita a função numa futura reunião.

Por outro lado, uma vez que o orador, propositadamente, não indica de forma explícita qual o coletivo a que se está a referir, muitas vezes torna-se difícil saber se estamos nessa primeira situação. Isto é especialmente verdade em reuniões onde participam pessoas de diferentes culturas e países: um determinado coletivo pode ser discriminado no ambiente do orador mas não no teu.

Então, no momento em que decides ser tu a avaliar o discurso "Hoje viajamos para" (idealmente, dias antes da reunião em que acontece), é uma excelente ideia contactar o orador e perguntar-lhe qual o coletivo que escolheu. Isto servirá também como subtil lembrete de que o discurso não tem uma natureza turística.

Recursos

 


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